quarta-feira, 23 de maio de 2012

REVISITANDO O ATO INSEGURO

Esta semana recebi um Email que dizia o seguinte:



"Prezado Armando Campos. Já o conheço há alguns anos 
pessoalmente e também o seu livro sobre CIPA. 
Por falta de mais espaço, gostaria da fineza de me 
informar, porque você ainda usa em seus livros, 
a expressão " ato inseguro", uma vez que a 
mesma já foi inclusive retirada da NR-1. 
Obrigado e um abraço. "


Antes de dizer minha resposta, me manifesto dizendo que gosto de receber Email com: elogios, sugestões, críticas, de tradutores do meu livro “CIPA – uma nova abordagem”, elas são bem vindas e ajudam a fazer com que ele fique melhor.

A reposta que dei, foi a seguinte:

“Com relação ao seu comentário, eu não sei qual edição 
você tem, eu estou com a 19ª Edição em mãos e na página 214, 
do livro eu cito que o termo "ato inseguro" não mais existe 
na Legislação brasileira. 

Para seu entendimento no livro tenho mantido o termo por 
causa da NBR 14280 (está em vigor) que contém esta causa de 
acidente, é assim que contextualizo. 

Não é porque o Ministério do Trabalho e Emprego alterou a NR 1, 
letra "b", item 1.7, que acabou o ato inseguro. Não se acaba com 
Ato Inseguro por Portaria. A mudança na nossa legislação 
contrariando o resto do mundo ocorreu por culpa 
dos Relatórios de Investigação e Análise de Acidentes 
que fizeram o Trabalhador virar "Réu", ou seja, ele ficava 
sendo culpado por tudo. 

Nesta edição do CIPA tem inclusive na pg 255, o modelo 
de Relatório de Investigação de Acidentes da IN 88/2010, 
do MTE e lá não consta o termo Ato Inseguro. 

Quando investigo acidentes a metodologia de Investigação 
de acidentes que tenho usado é o "Tripod" do 
James Reason, nele consta o "Ato Inseguro" logo 
depois das "Defesas". 

No dia que tivermos maturidade em SST e uma Cultura de Segurança 
o "Ato Inseguro" vai voltar sem ser sinônimo de "Réu", vai 
ser mais uma causa dos acidentes como são: as decisões 
falíveis, as falhas latentes, as pré condições, o ato 
inseguro e as falhas de defesas". 

Em tempo nas minhas investigações em vez de Ato Inseguro tenho 
usado o termo Falhas Ativas”. 

Atenciosamente, 

ARmando Campos "



Minha resposta está embasada em estudos publicados sobre acidentes de trabalho e algumas destas informações estão disponíveis na Internet, dentre elas está uma apresentação do James Reason, disponível em http://www.vtt.fi/liitetiedostot/muut/HFS06Reason.pdf , em um dos slides consta a Figura 1:



Figura 1: A perspectiva do sistema de eventos adversos (Reason, 2006) 

Na figura 1 pode-se visualizar logo após as defesas o “unsafe act” (ato inseguro), na lateral estão as “vias de condições latentes”, no centro os “fatores dos locais de trabalho” e na base os “fatores organizacionais”. Repare o sentido das setas da Investigação, logo após as defesas vencidas está o “ato inseguro”.

Ao tratar do “Erro” o Reason, apresenta origens distintas e que estão inseridas no contexto das relações de trabalho, das percepções dos trabalhadores, eles estão na figura 2.

Figura 2: Principais tipos de erros (Fonte: Côrrea, Solange – adaptado Reason, 2006) 

Na figura 2 o Reason apresenta os principais tipos de erros, onde faço um destaque para as “falhas de execução e memorização” e a violação das normas. O ser humano é passível destes erros, dependendo do seu “momento”.

Além disto, em 1996, o INSHT: Instituto Nacional de Seguridad e Higiene en el Trabajo, da Espanha publica a Nota Técnica “NTP 415: Actos inseguros en el trabajo: guía de intervención”, que trata a questão da seguinte forma: “Em uma intervenção sobre o subsistema social da empresa são cobrados de forma relevante os comportamentos dos trabalhadores, os quais são funções, basicamente, da inter-relação de umas determinadas atitudes e de uns determinados contextos laborais”.

Ao tratar as atitudes a NTP 415 cita: “Na área em questão aqui, as atitudes erradas são aquelas que favorecem a predisposição ao risco, enquanto as atitudes corretas são aquelas em favor da segurança, ou seja, não correr riscos. Supõe-se que as atitudes favoráveis ​​à segurança são aqueles que predispõem a entender a existência de riscos, e comportar-se corretamente sobre a luz de procedimentos preventivos para evitá-los. Estes procedimentos serão estabelecidos depois de terem sido identificados e feito uma estimativa de risco e avaliação por critérios científicos e técnicos. Tenha em mente que muitas vezes esses critérios científicos e técnicos não correspondem aos critérios do senso comum que o trabalhador tem para interpretar a realidade”.

Nesta NTP 415 estão apresentadas as Dimensões do Risco (ver figura 3).


Figura 3: Dimensiones del riesgo (fonte: NHT 415) 

Na figura 3 a NTP correlaciona Dimensões do Risco e Medidas de Gestão do Risco, sendo que as Medidas Preventivas Psicossociais, estão destacadas e são mais subjetivas, dependentes de quem as intepreta. É aqui que está concentrada boa parte da origem dos “atos inseguros”.

Continuar a falar deste tema seria extenso, mas gostaria de destacar que as pessoas não devem entender que ao tirar uma palavra do vocabulário ela passa a não existir. O que não se podia era deixar que o trabalhador virasse “réu” o tempo inteiro, devido a análises de acidentes: frágeis, medrosas e inconsistentes. Nelas não estão as falhas Latentes e as Decisões Falíveis, sendo esta última caracterizada por: optar por terceirização selvagem, quarteirização, falta de definição de competências, dentre tantas outras.

No dia que tivermos maturidade em Segurança e Saúde no Trabalho e uma Cultura de Segurança, teremos clima para que o termo “Ato Inseguro” volte ao vocabulário da SST no Brasil, sem medo dele ser apresentado de forma solitária e sim na companhia das outras causas já citadas e identificadas pelo James Reason.

Rogo para que este dia chegue logo.

Traduza este texto para sua realidade e faça comentários eu gostaria de recebê-los.

Abraços
  
ARmando Campos

Um comentário:

Nanda Valéria disse...

queria usar o ato inseguro no meu trabalho...como sugere que o faça?